As Provas Científicas da Existência de Deus

entrevista com

Amit Goswami

Tradução: Patrícia Zimbres

Professor de Física na Universidade de Oregon, Amit Goswami, PhD, faz parte de um crescente grupo de cientistas renegados que, em anos recentes, se aventuraram no domínio da espiritualidade, na tentativa de interpretar os achados aparentemente inexplicáveis da Física Quântica – a Física das partículas elementares. O livro de Goswami, The Self-Aware Universe: How Consciousness Creates the Material World (O Universo Autoconsciente: Como a Consciência Cria o Mundo Material, publicado no Brasil pela Editora Rosa-dos-Ventos), traz uma interpretação dos dados experimentais da Física moderna, numa tentativa de demonstrar que essas descobertas estão em perfeita consonância com as verdades místicas mais profundas.

Segundo Goswami e outros que compartilham da mesma visão, o universo, para existir, necessita que um ser consciente tenha consciência dele. Sem um observador, o universo existe apenas como um potencial abstrato, uma possibilidade, exatamente como sempre afirmou o misticismo oriental. Goswami afirma que a ciência, atualmente, tornou-se capaz de validar a intuição do místico e de colocar em questão o paradigma materialista que vem dominando o pensamento científico e filosófico nos últimos séculos.

A entrevista aqui resumida foi realizada por Craig Hamilton para o What is Enlightenment Magazine – www.wie.org

WIE –  Em seu livro, você fala da necessidade de uma mudança de paradigma. Você poderia falar um pouco sobre como concebe essa mudança? Mudança do quê para quê?

AG. –   A visão de mundo atual postula que tudo é feito de matéria, e que tudo pode ser reduzido às partículas elementares da matéria, os constituintes básicos – os blocos de construção – da matéria. E a causa surge das interações desses componentes básicos, ou partículas elementares. As partículas elementares formam os átomos, os átomos formam as moléculas, as moléculas formam as células e as células formam o cérebro. Mas a causa última é sempre as interações entre as partículas elementares. Essa é a crença – toda a causa provém das partículas elementares. Isso é o que chamamos “causação de baixo para cima”. Nessa visão, o que os seres humanos – você e eu – consideram como seu livre-arbítrio, na verdade, não existe. Ele é apenas um epifenômeno, um fenômeno secundário, secundário ao poder causal da matéria. E qualquer poder causal que pareçamos exercer sobre a matéria não passa de uma ilusão. Esse é o paradigma atual.

            A visão oposta é a de que tudo começa com a consciência. Ou seja, a consciência é a base de todo o ser. Nessa visão, a consciência impõe uma “causação de cima para baixo”. Em outras palavras, nosso livre-arbítrio é real. Quando agimos no mundo, estamos realmente agindo com poder causal. Essa visão não nega que a matéria também possua potência causal – ela não nega que exista poder causal com origem nas partículas elementares – a causação de baixo para cima –, mas insiste em que a causação de cima para baixo também existe. Ela aparece na nossa criatividade e em nossos atos de livre-arbítrio, ou quando tomamos decisões morais. Nessas ocasiões, estamos realmente testemunhando a causação de cima para baixo, exercida pela consciência.

WIE –  Você sugere também que a ciência parece estar corroborando o que muitos místicos disseram, ao longo de toda a história – que parece haver um paralelismo entre as descobertas atuais da ciência e a essência dos ensinamentos espirituais perenes.

AG. –   Elas são o ensinamento. Não se trata apenas de paralelismo. A idéia de que a consciência é a base de todo o ser é a essência de todas as tradições espirituais.

WIE –  Você diz que a ciência moderna, partindo de um ângulo totalmente diverso, e sem levar em conta a existência de uma dimensão espiritual, de algum modo mudou de rumo e, em resultado de suas próprias descobertas, vem confirmando a visão espiritual?

AG. –   Exatamente. E isso não é inteiramente inesperado. Desde os primórdios da Física Quântica, que começou no ano de 1900, para atingir seu pleno desenvolvimento em 1925, quando as equações da Mecânica Quântica foram descobertas, a Física Quântica nos deu indicações de que a visão de mundo poderia mudar. Físicos firmemente materialistas adoram comparar a visão de mundo clássica com a visão de mundo quântica. É claro que eles não iriam tão longe a ponto de abandonar a idéia de que existe apenas a causação de baixo para cima e da supremacia da matéria, mas o fato é que eles viram na Física Quântica um grande potencial de mudança. E o que aconteceu foi que, a partir de 1982, os resultados dos experimentos de laboratório começaram a chegar. Foi nesse ano que, na França, Alain Aspect e seus colaboradores realizaram o grande experimento que provou definitivamente a veracidade dos conceitos espirituais, particularmente do conceito de transcendência. Você quer que eu entre em detalhes sobre o experimento de Aspect?

WIE –  Sim, por favor.

AG. –   Para localizar o fato em termos históricos: por muitos anos, a Física Quântica já vinha dando indicações de que existem níveis de realidade que não o nível material. Isso começou a acontecer quando os objetos quânticos – os objetos da Física Quântica – começaram a ser vistos como ondas de possibilidade. No começo, as pessoas pensavam: “Ah, são apenas ondas comuns”. Mas, logo em seguida, descobriu-se que não, que eles não eram ondas no espaço e no tempo. Eles não podem, absolutamente, ser chamados de ondas no espaço e no tempo – eles possuem propriedades que não se coadunam com as das ondas comuns. Então, essas ondas passaram a ser reconhecidas como sendo ondas em potencial, ondas de possibilidade, e esse potencial foi reconhecido como transcendente, de algum modo além da matéria.

Maso fato é que, por muito tempo, esse potencial transcendente não ficou muito claro. Foi então que o experimento de Aspect demonstrou que não se trata apenas de teoria, que existe realmente um potencial transcendente, os objetos realmente têm conexões fora do espaço e do tempo – veja bem, fora do espaço e do tempo! O que acontece, nesse experimento, é que um átomo emite dois quanta de luz, chamados de fótons, que vão em sentidos opostos e que, de alguma maneira, esses fótons afetam o comportamento um do outro à distância, sem trocar qualquer tipo de sinal através do espaço. Note bem: sem trocar qualquer tipo de sinal através do espaço, mas instantaneamente, afetando um ao outro. Instantaneamente.

Bem, há muito tempo, Einstein provou que é impossível dois objetos afetarem um ao outro instantaneamente dentro do espaço e do tempo, porque tudo tem que se mover com um limite máximo de velocidade, que é a velocidade da luz. Portanto, qualquer influência, se ela viajar através do espaço, teria que levar um tempo finito para chegar a seu alvo. Essa é a chamada idéia de “localidade” Todos os sinais são considerados locais, no sentido de que eles têm que levar um tempo finito para viajar através do espaço. E, no entanto, os fótons de Aspect – os fótons emitidos pelo átomo, no experimento de Aspect – influenciam-se um ao outro à distância, sem trocar sinais, porque eles o fazem instantaneamente – mais rápido que a velocidade da luz. Deduz-se daí que essa influência não poderia ter viajado através do espaço. Ao invés disso, essa influência tem necessariamente que pertencer a um domínio de realidade que temos que reconhecer como o domínio transcendente.

WIE –  Isso é fascinante. Mas a maioria dos físicos concordaria com essa interpretação desse experimento?

AG. –   Bem, os físicos têm que concordar com esta interpretação desse experimento. Muitas vezes, é claro, eles adotam o seguinte ponto de vista: “Bem, é claro… são experimentos… Mas essa relação entre partículas, na verdade, não é importante. Não devemos examinar as conseqüências desse domínio transcendente – se é que ele pode ser interpretado dessa maneira”. Em outras palavras, eles tentam minimizar o impacto desse fato, tentando se aferrar à idéia da supremacia da matéria.

            Mas, no fundo do coração, eles sabem. Em 1984 ou 1985, na reunião da Sociedade Americana de Física, na qual eu estive presente, ouviu-se um físico dizer a outro físico que, após o experimento de Aspect, qualquer um que não acredite que há alguma coisa de muito estranho no mundo deve ter pedras dentro da cabeça.

WIE –  Então, o que você está dizendo é que, na sua opinião, que é compartilhada por alguns outros, é óbvio que a idéia de uma dimensão transcendente tem que entrar em cena, para que se possa compreender tudo isso.

AG. –   Sim, é isso. Henry Stapp, que é um físico da Universidade da Califórnia em Berkeley, diz isso de forma bastante explícita, em um de seus trabalhos escritos em 1977, que coisas fora do espaço e do tempo afetam as coisas dentro do espaço e do tempo. No campo da Física Quântica, quando estamos lidando com objetos quânticos, esse fato é indiscutível. Mas, o cerne da questão, o mais surpreendente, é que nós estamos sempre lidando com objetos quânticos, porque, afinal de contas, a Física Quântica é a Física de todos os objetos. A Física Quântica é a única Física que temos, seja para o microscópico ou o macroscópico. Embora esse fato seja mais evidente quando lidamos com fótons ou elétrons, com os objetos microscópicos, acreditamos que toda a realidade, tudo o que é manifesto, toda a matéria, sejam regidos pelas mesmas leis. E, se for mesmo assim, esse experimento está nos dizendo que devemos alterar nossa visão de mundo, porque nós também somos objetos quânticos.

WIE –  Essas são descobertas fascinantes, que vêm inspirando muitas pessoas. Diversos livros já tentaram estabelecer um vínculo entre a Física e o misticismo. O Tao da Física, de Fritjof Capra, e The Dancing Wu Li Masters, de Gary Zukav, atingiram um público muito, muito vasto. Em seu livro, contudo, você menciona que sentia que havia algo que ainda não havia sido tratado, e que você vê como sendo sua contribuição particular a essa questão. Você poderia nos dizer alguma coisa sobre o que existe de diferente no que você vem fazendo, em comparação com o que já foi feito antes neste campo?

AG. –   Eu fico contente que você tenha feito essa pergunta. Esse ponto deve ficar esclarecido, e eu tentarei explicar da maneira mais clara possível. Os trabalhos mais antigos, como O Tao da Física, foram muito importantes para a história da ciência. No entanto, esses primeiros trabalhos, apesar de afirmarem o aspecto espiritual dos seres humanos, basicamente se atinham à visão materialista do mundo. Em outras palavras, eles não questionavam a opinião dos materialistas realistas, de que tudo é feito de matéria. Essa visão nunca foi posta em questão, em nenhum desses livros mais antigos. Na verdade, meu livro foi o primeiro a se opor frontalmente ao materialismo, embora baseando-se numa rigorosa explicação em termos científicos. A idéia de que a consciência é a base do ser, é claro, sempre existiu na psicologia, como a psicologia transpessoal, mas, fora dela, nenhuma tradição científica e nenhum cientista a viu com tanta clareza.

            Tive a sorte de reconhecer essa idéia dentro da Física Quântica, reconhecer que todos os paradoxos da Física Quântica podem ser solucionados, se aceitarmos a consciência como a base do ser. Foi essa, portanto, minha contribuição singular que, é claro, possui o potencial de subverter os antigos paradigmas, porque, hoje, somos realmente capazes de integrar ciência e espiritualidade. Em outras palavras, Capra e Zukav – embora seus livros sejam muito bons – ativeram-se a um paradigma essencialmente materialista, não representando, portanto, uma mudança de paradigma, nem trazendo uma reconciliação entre a espiritualidade e a ciência. Porque se tudo, em última análise, é material, toda a eficácia causal tem que vir da matéria. Então, a consciência é reconhecida, a espiritualidade é reconhecida, mas apenas como epifenômenos causais, como fenômenos secundários. E uma consciência epifenomênica não basta. Quer dizer, ela não é operante. Esses livros, portanto, embora reconheçam nossa espiritualidade, em última análise a vêem como derivada de algum tipo de interação material.

Mas não é essa a espiritualidade de que Jesus falava. Essa não é a espiritualidade que enchia de êxtase os místicos orientais. Essa não é a espiritualidade que faz um místico dizer: “Eu agora sei como é a realidade, e esse saber põe fim a todo o sofrimento. Essa consciência, essa alegria, é infinita”. Afirmações exuberantes como essa não poderiam ser feitas com base numa consciência epifenomênica, mas apenas quando se reconhece a própria base do ser, quando se compreende de forma direta que o Um é Tudo.

Ora, um ser humano que não passa de um epifenômeno não poderia ter tal consciência. Não faria sentido, ele perceber que ele é o Todo. É isso que eu tenho a dizer. Enquanto a ciência tomar como base uma visão de mundo materialista, por mais que ela tente acomodar a experiência espiritual em termos de paralelos, ou em termos de química cerebral, ou seja lá do que for, ela estará se aferrando ao velho paradigma. O velho paradigma só será abandonado e só haverá uma reconciliação entre a ciência e a espiritualidade quando a ciência for estabelecida sobre a base da noção espiritual fundamental, de que a consciência é a base de todo o ser. Foi isso que fiz no meu livro, e esse foi o começo. Mas outros livros já foram escritos, que reconhecem o mesmo.

WIE –  Quer dizer que há pessoas que corroboram suas idéias?

AG. –   Há pessoas que, agora, estão vindo a público reconhecer as mesmas coisas, que essa visão é a maneira correta de explicar a Física Quântica, e também de nortear o desenvolvimento futuro da ciência. Ou seja, a Física atual apenas mostrou os paradoxos quânticos, mas provou-se totalmente incompetente para explicar fenômenos paradoxais e anômalos, como a parapsicologia, a paranormalidade e até mesmo a criatividade. E até mesmo matérias tradicionais, como a percepção ou a evolução biológica, colocam questões que essas teorias materialistas não conseguem explicar. Para lhe dar um exemplo, na biologia existe o que é chamado de equilíbrio pontuado. O que isso significa é que a evolução não é apenas lenta, como Darwin percebeu, mas que há também épocas de evolução rápida, que são chamadas de “sinais de pontuação”. Mas a biologia tradicional não tem explicação para esse fato.

            No entanto, se fizermos uma ciência baseada na consciência, na primazia da consciência, podemos ver criatividade nesse fenômeno, a criatividade real da consciência. Em outras palavras, podemos realmente ver que a consciência opera de forma criativa, até mesmo na biologia, até mesmo na evolução das espécies. Hoje, portanto, somos capazes de preencher essas lacunas que a biologia convencional não consegue explicar com idéias que são, essencialmente, idéias espirituais, tais como a consciência criando o mundo.

WIE –  Isso me faz pensar no subtítulo de seu livro – Como a Consciência cria o Mundo Material. Essa, obviamente, é uma idéia bastante radical. Você poderia explicar de forma um pouco mais concreta como isso de fato acontece, na sua opinião?

AG. –   Isso é facílimo de explicar, porque na Física Quântica, como eu disse antes, os objetos não são coisas definidas, como nós estamos acostumados a vê-los. Newton nos ensinou que os objetos são coisas definidas, que podem ser vistas o tempo todo, movendo-se em trajetórias definidas. Não é assim que a Física Quântica vê os objetos. Nela, os objetos são vistos como possibilidades, ondas de possibilidade. Então, surge a questão: o que converte a possibilidade em atualidade? Porque, quando vemos, vemos apenas acontecimentos atuais. Quando você vê uma cadeira, você vê uma cadeira atual, não uma cadeira possível.

WIE –  Certo.Espero que sim.

AG. –   Todos nós esperamos que sim. E isso é o que é chamado de “paradoxo da mensuração quântica”. É um paradoxo porque quem somos nós para fazer essa conversão? Porque, afinal de contas, no paradigma materialista, nós não temos qualquer eficácia causal. Não somos nada além do cérebro, que é feito de átomos e partículas elementares. E como pode um cérebro que é feito de átomos e partículas elementares converter uma onda de possibilidade que ele próprio é? O próprio cérebro é feito das ondas de possibilidade dos átomos e das partículas elementares, de maneira que ele não conseguiria converter sua própria onda de possibilidade em atualidade. Isso é chamado de paradoxo. Nessa nova visão, a consciência é a base de todo o ser. Então, quem converte a onda de possibilidade em atualidade? A consciência converte, porque a consciência não obedece as leis da Física Quântica. A consciência não é feita de matéria. A consciência é transcendente. Você consegue, exatamente aí, perceber a visão que transforma o paradigma – como pode-se dizer que a consciência cria o mundo material? O mundo material da Física Quântica é pura possibilidade. É a consciência, através da conversão da potencialidade em atualidade, que cria o que vemos como manifesto. Em outras palavras, a consciência cria o mundo manifesto.